Adoçar ou não adoçar?
Fico muito triste quando um cliente se sente constrangido ou se desculpa pelo fato de querer adoçar o SEU próprio café. Esse constrangimento descabido é fruto de um fenômeno que chamo de “Ditadura do café sem açúcar”.
Ele surgiu da vontade e necessidade das pessoas que trabalham com café especial de mostrar para o consumidor que o açúcar é usado geralmente para mascarar defeitos e problemas na bebida. Louvável! Realmente, os cafés de qualidade têm amargor mínimo ou ausente e devem “descer redondos”. No entanto, isso não exclui a possibilidade de adição de nenhum ingrediente num café de ótima qualidade, inclusive do açúcar.
Algumas informações sobre açúcar e café:
A sacarose, frequentemente utilizada no Brasil, é uma das cadeias de açúcares que compõem o café, inclusive a mais incidente.
A maioria dos italianos, criadores do Espresso, adoçam sua bebida.
O açúcar é geralmente utilizado para equilibrar alimentos com nível alto de amargor, como cafés de baixa qualidade, por exemplo, ou acidez aguda, como suco de limão.
O problema é que, na sede de educar o consumidor, os profissionais da área de café de qualidade incorrem em dois erros. O primeiro é desconsiderar que a necessidade de doçura de cada pessoa é diferente e que pode ser bem maior do que a da média do pessoal da área de café Especial. Muitas pessoas têm baixa tolerância a níveis mínimos de amargor ou acidez e, para ter prazer com determinadas bebidas ou comidas, usam açúcar. Pressupor que todas as pessoas gostam dos mesmos níveis de doçura é um grande equívoco, que pode levar o consumidor a não gostar de um café maravilhoso.
Outro fator importantíssimo, frequentemente esquecido pelos baristas e torrefadores, é a força do hábito de consumo. De maneira geral, as pessoas no Brasil estão acostumadas a cafés amargos e adstringentes (sensação de secura na boca). Provar um café de alta qualidade é, inevitavelmente, uma experiência que causa estranhamento, bom ou ruim. Temos que minimizar a margem de risco ou erro dessa experiência e isolar a variável café, ou seja, pedir que a pessoa adicione o açúcar para que consiga comparar a real diferença entre o café com que está acostumada em seu dia-a-dia e o café de qualidade.
Uma outra questão é que alguns baristas implicam com o açúcar, mas colocam leite e outros ingredientes como raspinha de limão ou chantilly, que alteram bem mais o café do que somente o açúcar. Então por coerência, se um café especial admite adição de leite, como num cappuccino, por exemplo, por que implicar com a sacarose? Que tal encararmos o café adoçado como um drinque composto por dois ingredientes?
Queremos que as pessoas tenham prazer com café e que bebam café de qualidade. Deixar de adoçar suas xícaras deve ser um processo natural, sem traumas ou constrangimentos e que geralmente ocorre.
Então, bons cafés, com ou sem açúcar!